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Dignidade

Não sou digno que a felicidade sorria para mim. Perceba que eu disse que não sou digno e não sou merecedor. É que a felicidade é fim último de todos e todos, sem exceção a merece. Mas ser digno de felicidade é diferente. Só é digno da felicidade aquele que possui bravura. É aquele que não tem medo dos nãos e das portas fechadas. Aquele que cria as condições ou, pelo menos, tenta criar os meios de atingi-la.  A felicidade é passiva. Você quem deve ir atrás dela e não esperar que ela aconteça. A felicidade se constrói enquanto se vive, não é um estado de graça, que uma vez atingido, permanece. Ela é como a própria vida. Ela até paira por nós, mas só de fato vive àquele que escolhe os próprios caminhos.  Só é feliz quem vive. Só vive quem é feliz. Os demais, se contentam com a efêmera sensação de ser feliz, só porque, num dia de céu claro, um leve sorriso foi visto no espelho.

Sob o Azul do Céu

Caminhei até um campo, no intuito de desviar-me da civilidade que os prédios e casas trazem à tona todos os dias. Assim que encontrei um gramado verde, apesar da seca que assola nossos dias, posicionei-me de modo que ao deitar, nada mais além do céu fosse alcançado pela minha visão. Estava determinado a fitar o infinito, como se de repente, eu pudesse ver o fim de tudo. Talvez esteja aí a beleza da imensidão: mesmo que preste a máxima atenção possível, não dá pra saber onde é o começo e onde é o fim. Tudo se entrelaça.

Posicionado conforme eu queria, coloquei-me então a simplesmente prestar atenção no que via. Era tudo azul, pincelado aqui e acolá de branco. Às vezes piscavam pontinhos pretos, que pelo bater de asas, às vezes pareciam cintilantes, quando refletiam o sol. Fosse algum urubu ou pássaro mais esbelto, não fazia diferença. Estava tudo em harmonia para um momento de paz e descoberta. O que poderia ser descoberto? Não fazia ideia. Uma vez que a mente se pôs a desbravar o conhecido ou desconhecido, visível ou invisível, tudo era possível.

A primeira coisa na qual a minha mente se fixou, foi no fato de sermos um grãozinho de areia em meio a vastidão que nos cerca. Sobre a minha cabeça um céu infinito. Na minha mente, o pensamento do quão minúsculo eu estaria sendo visto se algum avião passasse por ali e as pessoas no avião me vissem. Talvez eu nem fosse visível. Atentei-me, depois, ao fato de que tudo ao redor é vasto, mas não nos damos conta disso ou apenas fixamos naquilo que vemos diariamente, tornando o infinito quantificável.

Foquei depois em mim. Talvez eu também fosse infinito e ainda não tivesse me dado conta. Talvez a minha percepção de mim mesmo me limitasse, tal qual eu fazia com a percepção do céu, para o qual eu mal olho nos dias normais. Talvez eu não seja de fato invisível como imagino que eu seja. Posso não ser infinito, mas também não sou pequeno. Pensei então, que para o céu, tanto faz se todos os seres vivos o notam ou deixam de notar. Ele é o que é. Só o vê de verdade quem quer.

Talvez eu sempre tenha tido medo de ser quem sou. Talvez eu sempre tenha querido ser outro, porque na minha cabeça, o meu eu real não fosse merecedor de atenção, que ninguém se importaria comigo. Talvez eu mesmo tivesse me abandonado. E então ri de mim mesmo. Ri porque me preocupei mais em parecer do que ser. E quando fui, tinha a certeza de que não faria diferença, não importaria, nem a mim, nem aos outros. Pobre eu, tão perdido de si. E que sorte a minha que um dia decidi olhar para o céu e olhando para o céu, decidi olhar para mim.

Quando me dei conta, já estava pensando em como seria a vida, se a gente pudesse dizer a todos tudo que sentimos. Como seria bom nos livrarmos das amarras que nos prendem, às vezes, em dolorosas realidades que fazem de nós prisioneiros de nós mesmos. E aí eu gritaria tudo que sinto. Mas depois me veio a mente que algumas dessas amarras, são as virtudes que fazem de nós homens bons. Em alguns momentos o que nos resta é a esperança, em outras apenas ideias, até que chega a maturidade e com ela o entendimento que nem toda distância significa afastamento e nem todo silêncio é desprezo. 

E então adormeci. E adormecido, sonhei. No sonho um senhor, que ao mesmo tempo aparentava ser novo e ser velho, aproximou-se de mim e num sussurro me disse: "paciência". O jovem-velho era o tempo. Numa simples palavra continha todo esse significado: "Não apresse a vida, e também não deixe de viver. Não se desmantele inteiro, na busca de preencher vazios. Cada coisa acontece no seu devido tempo. Mas também não espere demais, porque o tempo passa. O medo é amigo, mas também inimigo, leve o tempo que precisar, mas saiba usar o tempo.".

Então acordei. Acordado, me dei conta de corria contra o tempo, em busca de algo que eu nem sabia o que era. Que eu tinha pressa de chegar em algum lugar que eu nem sei onde fica. Nessa ânsia por conquistar o que eu nem sabia o que era, perdi mais que ganhei. Como eu queria amar, se eu nem sabia o que era amor? Como eu queria ser amado, se eu não sabia receber amor?

Sob o azul do céu, chorei. Chorei por todas as vezes em que me calei, por todas as vezes em que gritei, por todas as vezes em que fiz o que não queria fazer e por todas vezes que errei. Chorei. Chorei por todas as alegrias que vivi e por todos os acertos que cometi. Chorei. Chorei feito criança. E chorando, sorri. Sorri por tudo agora ser novo e por tudo que eu poderia ser. Sorri pela dádiva do tempo.

Sorri! Porque ali eu revivi.

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