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Último Texto

Dignidade

Não sou digno que a felicidade sorria para mim. Perceba que eu disse que não sou digno e não sou merecedor. É que a felicidade é fim último de todos e todos, sem exceção a merece. Mas ser digno de felicidade é diferente. Só é digno da felicidade aquele que possui bravura. É aquele que não tem medo dos nãos e das portas fechadas. Aquele que cria as condições ou, pelo menos, tenta criar os meios de atingi-la.  A felicidade é passiva. Você quem deve ir atrás dela e não esperar que ela aconteça. A felicidade se constrói enquanto se vive, não é um estado de graça, que uma vez atingido, permanece. Ela é como a própria vida. Ela até paira por nós, mas só de fato vive àquele que escolhe os próprios caminhos.  Só é feliz quem vive. Só vive quem é feliz. Os demais, se contentam com a efêmera sensação de ser feliz, só porque, num dia de céu claro, um leve sorriso foi visto no espelho.

Chatice

Desde que partiu, o dia, que possui as mesmas vinte e quatro horas de sempre, parecem agora durar setenta e duas horas. Um gradissíssimo absurdo por parte dos relógios resolverem que o minuto agora passa a conta gotas. Além disso, parece que eles se perdem na conta e tem que recomeçar a contagem.

O engraçado é que antes de você partir, os miseráveis pareciam estar competindo com Usain Bolt e corriam como se disputassem a medalha de ouro nas olimpíadas. Um grande ultraje da parte deles. Ora, deveriam entrar em consenso e passar na mesma medida, na ausência e na presença.

Se você que me lê nesse momento for daqueles chatonildos, vai dizer que o tempo passa igual, que a minha percepção e atenção, em relação ao tempo, que mudou. E sabe por que isso é chato? Porque é verdade. Se na presença eu me desprendia de relógios e medidas, na ausência, me apeguei a eles. Porque tudo ficou um pouco mais chato. Aí o chato vai argumentar que tudo continua igual, o que mudou foi eu. E mais uma vez o chato tem razão.

Aí eu venho aqui, reclamar das chatices da realidade, como se quem me lê quisesse ouvir reclamações. Ora, como um poeta que sou, talvez devesse fazer dos meus sentimentos matéria-prima para uma obra de arte que se perpetuaria por gerações. Mas antes de um bom poeta, eu sou um bom ser humano e como bom ser humano, faço o que melhor sabemos fazer: reclamar. "Ah, mas eu não reclamo". Tudo bem, você escolhe não reclamar, mas você é um bom reclamante como todos nós que fazemos parte da espécie.

E aqui, agora, escrevendo, quando não deveria estar, o relógio resolveu novamente que era hora de correr uma maratona. Talvez o relógio esteja de mal de mim. Não. É só um objeto inanimado que nós mesmos inventamos para contar o tempo. E pra quê? Com certeza para podermos quantificar quantas horas chatas se passaram entre um evento e outro. 

E no fim das contas, o tempo ainda continuará sendo o melhor ativo contra o tédio, mestre da sabedoria e remédio para os dessabores da vida. Como é senhor de si, o tempo. Como é senhor de nós. E como é valoroso. E quando quer, é o senhor da chatice.

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